domingo, 23 de março de 2008

Crítica de Cinema: Cada um com seu cinema


O cineasta e o cego

Trinta e três cineastas foram convidados a dirigir curtas-metragens que tratassem da relação do espectador com o cinema, em comemoração ao 60. aniversário do Festival de Cannes. Dois ou três minutos nas mãos de grandes nomes do cinema contemporâneo, como Alejandro Iñárritu, David Lynch, Gus Van Sant, Roman Polanski, Lars Von Trier, Win Wenders e Walter Salles, resultam em um pouco de tudo – ou de nada.

Não se trata de uma obra única e, portanto, gostar ou não gostar de “Cada um com seu cinema” é difícil. Gostamos muito de algumas coisas, pouco de outras, e nada de algumas poucas. Para mim, que tenho assumida dificuldade com a linguagem do cinema oriental, mesmo três minutos de alguns pequenos filmes se tornaram cansativos.

Dentro os pontos negativos, sinalizo duas ausências. Em primeiro, a falta de um diretor africano. Ignoro a situação do cinema africano, e parece que Cannes faz o mesmo. Os outros continentes estão bem representados, mas, da África mesmo, só a visão européia – e sensível – de Win Wenders. A outra ausência – que, acredito, outros fãs devem ter notado – é de Almodóvar, já premiado em Cannes com “Tudo sobre minha mãe” (melhor diretor). E faz falta mesmo.

Outro ponto interessante é o fato de três dos diretores tratarem de uma tema inusitado (ou não): o espectador cego. Alejandro Iñárritu deixa de lado a violência de Amores Brutos, Babel e 21 gramas e presenteia-nos com Anna. A angústia de Anna talvez importe menos do que a dos diretores que resolveram tomar este caminho. E que, aliás, pode ser de todos nós. Quantas vezes não estaremos fazendo cinema para cegos? Quantos de nossos espectadores já saíram das salas de cinema sem saber se o filme que dirigimos é em cores ou preto-e-branco?

Para quebrar o clima de aflição em saber até onde a mensagem que desejamos passar será alcançada pelo interlocutor – o que, creio, tenha excelente representação na imagem do espectador cego – só Walter Salles, com Caju e Castanha. Ou Lars Von Trier que, como muitos de nós, já desejou matar o espectador da cadeira ao lado. Para quem gosta de cinema, “Cada um com seu seu cinema” é uma boa pedida.

Assista ao curta de Alejandro Iñárritu aqui.

Obs.: não citar o excelente "Cinema erótico" de Roman Polanski foi um lapso. Também pode ser assistido no YouTube.

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